Conheça o Gaudí brasileiro e o escultor Berbela, artistas de Paraisópolis que usam materiais recicláveis
Casa de jardineiro foi inspirada (por acidente) em cultuado artista catalão. Já Berbela tem ateliê com 8 mil esculturas de peças de carro; veja mais sobre ‘Paraisópolis das Artes’
Publicado no Último Segundo do IG
Casa de jardineiro foi inspirada (por acidente) em cultuado artista catalão. Já Berbela tem ateliê com 8 mil esculturas de peças de carro; veja mais sobre ‘Paraisópolis das Artes’
Artista plástico por vocação, o jardineiro Estevão Conceição, de 56 anos, construiu durante quase três décadas o próprio ‘castelo’ de pedra na zona sul de São Paulo. E mal sabia que sua arte tinha traços do consagrado artista catalão Antoni Gaudí. Descoberto por uma jornalista e uma estudante de arquitetura, o baiano ganhou fama nacional e internacional pela sua obra e o apelido “Gaudí brasileiro”. A construção “Casa de Pedra” faz parte do roteiro Paraisópolis das Artes, que explora o turismo cultural e a criação de moradores nas vielas da comunidade.
Tímido, Estevão recebeu o iG em seu castelo de 75 m² e oito metros de altura. Já na entrada, o visitante pode ter a sensação de já ter visto a cena em algum lugar. E não está enganado. A fachada lembra o Parque Güell, em Barcelona, obra do então “desconhecido” que inspirou Estevão. É impossível não se impressionar com os detalhes das paredes irregulares de concreto, que receberam milhares de louças e objetos inusitados como decoração. Com uma pá de pedreiro e um balde de concreto, Estevão construiu sua imaginação até um jardim suspenso, no terceiro andar, onde abriga inúmeras plantas.
Para um visitante, o local é um labirinto na rua Hebert Spencer, número 38. Mas o baiano, natural de São Estevão (BA), não encontra dificuldades para encontrar o primeiro prato que cravou no concreto e sua peça favorita. “Comprei quase tudo o que você vê aqui. Fico chateado se alguém fala que peguei as peças na rua”. Estevão divide seu tempo entre o trabalho em um prédio de Pinheiros, na zona oeste, e idas aos bazares da Vila Madalena em busca de novas peças.
Durante a entrevista, ele ainda exibiu quadros e vasos decorados, que são vendidos até R$ 250. O “palácio” é divido com sua mulher Edilene Souza Conceição e os dois filhos, Stefana, de 18 anos, que ganhou o título de Miss Paraisópolis, e Enrique, de 10. Para a família, que já está acostumada com a frequência de visitantes estrangeiros, o roteiro cultural na favela só traz benefícios, inclusive financeiros.
Os artistas que participam do programa “Paraisópolis das Artes” recebem parte dos R$ 150 cobrados pelo ingresso. Antigamente, o artista e a mulher cobravam R$ 15 por um tour pela Casa de Pedra. Edilene guarda um livro de recados com as informações dos primeiros visitantes – maioria avassaladora estrangeira. “Quase todos saíram daqui querendo pagar mais, achando que eu cobrava pouco. É legal ver que todos gostam”, disse o modesto Estevão.
Arte com ferro-velho
Nas mãos de moradores da comunidade, materiais recicláveis, louças e até ferro-velho viram obras de arte. No ateliê improvisado ao lado de sua oficina, o mecânico Edinaldo da Silva, de 49, o “Berbela”, exibe mais de oito mil peças entre animais, plantas e personagens.
Apesar de vender algumas de suas criações, o pernambucano confessa que tem certo apego e não sente vontade “de perdê-las por aí”. “Meu sonho mesmo é expor todas elas e ter uma galeria”, diz Silva enquanto mostrava as peças espalhadas pela casa sujeitas às intempéries.
A paixão pela soldagem começou em 2001 quando viu uma reportagem na TV sobre um idoso criando réplicas de animais com ferro. “Se eu pudesse, largava a mecânica e viveria disso. É a minha paixão”. Para ele, o brasileiro ainda não reconhece o potencial dos artistas na comunidade. Entre os visitantes de sua garagem estão gringos e artistas plásticos, que são surpreendidos pela sensibilidade de Berbela.
O mecânico recebeu o iG enquanto soldava pedaços cortados de latinha e arames e criava um batalhão de formigas com asas. Ele garantiu que montaria pelo menos 40. E não era nenhuma encomenda. “Estava sentado aqui e vi uma fila imensa de formigas com asas. É a temporada delas, né? Quis fazer uma homenagem”, disse enquanto soldava o material sem nenhuma proteção nos braços e olhos.
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