Crianças ecológicas
Recentemente recebi de presente do meu neto Felipe (nove anos) um trabalho dele sobre o meio ambiente, antes apresentado na escola como parte da matéria de Ciências. Numa base quadrada de isopor ele colou uma caixa de papelão pintada, representando uma empresa poluidora. Ao redor, lixos e detritos. Em frente, uma floresta deteriorada feita de papel crepom verde. Ao lado, um rio (em papel crepom azul), com peixes boiando (segundo o autor, mortos). Um cenário triste, embora ache positivo constatar que essa discussão sobre ecologia acontece desde cedo, chamando a atenção das crianças, que têm a vida toda pela frente.
Por coincidência eu acabara de ler “Brasil, paraíso restaurável”, de Jorge Caldeira, Julia Sekula e Luana Schabib. Tenho a honra de conhecer o escritor Caldeira por circunstâncias profissionais e, como li outros livros dele (principalmente sobre história política e econômica brasileira), tornei-me sua fã de carteirinha. Além de aprender – muitos dos dados, didaticamente expostos em gráficos, tabelas e mapas, eu simplesmente desconhecia –, fiquei feliz com a conclusão (diferente da cacofonia pessimista que prevalece sobre o tema): é possível reverter o histórico de afastamento do homem em relação à natureza. Melhor ainda: o Brasil, em razão de suas características e potenciais, está em posição favorável, podendo ter papel muito relevante num mundo que pode vir a ser mais saudável no futuro – sem descurar de sua viabilidade econômica.
No fundo histórico do livro, os autores retomam a noção, predominante na Europa durante séculos, de que o Brasil conteria o próprio paraíso, o Éden bíblico. A partir do século 19, o uso crescente de máquinas e a industrialização fizeram esse paraíso ser esquecido e degradado – como como ocorreu em todo o mundo.
Mas a percepção de que essa trajetória nos levaria à autodestruição acendeu o alerta, e começa então a surgir um movimento de retorno à preservação da natureza, em especial à consciência da necessidade do uso de energia limpa, renovável (eólica, solar, hidrelétrica etc.), em substituição às fontes fósseis (carvão e petróleo em especial).
Nessa transição energética opera um misto de motivações, que inclui interesses econômicos e também a consciência de que a humanidade precisa do “paraíso” de volta para sobreviver – o que não é sinônimo de pensamento ingênuo de retorno a um passado inatingível. Como dizem os autores, “a natureza preservada está no centro da criação de valor econômico”.
A Alemanha é um destaque, tendo engajado a sociedade por meio de metas quantitativas para a transição energética, abandonando gradualmente o uso de carvão. A China, durante muito tempo mais preocupada em crescer a qualquer custo do que com a preservação da natureza, só foi instada a incluir metas de despoluição em seu planejamento nacional quando sofreu enormes prejuízos com desabastecimento de água, com a degradação do solo de plantio e custos com a saúde pública. Tornou-se líder em investimentos em energia renovável, e hoje é um grande exportador de veículos elétricos e placas de energia solar.
E o Brasil está bem na foto! Em sua matriz energética, 76% é hidreletricidade (no mundo 16,3%), 8% é biomassa (1,9% no mundo) e 8% eólica (4,4% no mundo). Já os combustíveis fósseis (carvão e gás) perfazem 61,2% da matriz energética no mundo, e somente 13% no Brasil. Em tempo: a constatação sobre nossa relativa vantagem no espectro da matriz energética não nos redime de atentar para outras frentes, como a proteção a nossas florestas e biomas.
Para quem, como eu, trabalha em grupo empresarial que inclui companhia com capital aberto em bolsa de valores norte-americana, o exemplo internacional de pressão em direção à preservação ambiental é óbvio: muitos fundos investidores estrangeiros têm entre suas regras pétreas não adquirir ações de empresas poluidoras, e diversos exigem comprovação das práticas da empresa em relação ao meio-ambiente.
Muito positivo que o mundo esteja caminhando nesta via de conscientização. Uma de minhas pequenas contribuições é tentar mostrar aos meus netos a importância das práticas saudáveis em relação ao meio ambiente. É importante o Felipe constatar, inclusive por meio de seu trabalho escolar, os malefícios da degradação ambiental. Que todas as crianças tenham a mesma oportunidade!
É mãe, avó e executiva do Grupo Folha e do Grupo UOL.