A verdade sobre as fake news
Por Adriana Teixeira
Após quase dois anos da pandemia de covid-19, todos nós já incluímos em nosso vocabulário a expressão em inglês fake news. Sabemos que elas estão espalhadas por todos os cantos da internet e invadem facilmente nossos telefones celulares. Participam ativamente de discursos entoados por políticos e atravessam nossos diálogos em casa, no trabalho, na escola e no lazer. Com forte circulação dentro e fora das mídias digitais, elas interferem nas emoções e podem alterar profundamente a nossa percepção da realidade.
Na tradução para a língua portuguesa, o termo fake news representa notícia (news) falsa (fake). Nos referimos, então, a uma categoria de informação que não descreve o mundo como ele se apresenta para nós (fato) e despreza o conhecimento acumulado pela humanidade ao longo dos séculos. Segundo historiadores, o vocábulo fake news surgiu nos Estados Unidos, no fim do século 19, para indicar textos jornalísticos (notícias) que continham histórias inventadas (falsas). Jornais norte-americanos daquela época classificados como sensacionalistas empregavam este recurso para atrair leitores.
As notícias falsas também participaram de episódios históricos, como a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) e a Guerra Fria (1946- 1991). No primeiro, relatos forjados, sem relação com os fatos, eram difundidos pelo governo nazista, na Alemanha, para ampliar seu apoio junto à população em direção ao extermínio dos judeus. No embate entre Estados Unidos e União Soviética, textos com inverdades circulavam em jornais de diferentes países para atacar a reputação de uma nação e fortalecer o poder da outra.
Então, chegamos à conclusão de que as fake news são antigas? Sim, textos com histórias inventadas já circulavam muito antes da chegada da internet, com o objetivo de influenciar condutas, destruir reputações, instituir poder e obter ganhos financeiros. Mas hoje estamos diante de um fenômeno nunca visto: a desinformação. Textos, áudios e vídeos com conteúdo falso/ enganoso circulam velozmente e massivamente, em ambiente digital, gerando teorias descoladas da realidade. Pesquisadores afirmam que o fenômeno da desinformação foi identificado em 2016, durante as eleições norte-americanas, com a vitória da celebridade Donald Trump. Ali vimos as fake news se afirmarem como estratégia de comunicação política nos meios digitais.
A desinformação está em todas as áreas em que há interação social, além da política: saúde, meio ambiente e setor empresarial, entre outras. As fake news são meticulosamente calculadas e percorrem o ambiente digital com a missão de enganar o público e influenciar a tomada de decisão. Não economizam nos apelos emocionais e avançam na imoralidade para convencer sobre suas falsas teorias.
Quem não se deparou, nos últimos dois anos, com áudio, vídeo ou texto cuja narrativa menosprezava a gravidade da Covid-19 e orientava para o abandono dos cuidados preventivos contra o coronavírus? Lidamos durante toda a pandemia com notícias falsas sobre saúde que operaram nas redes digitais para desmobilizar a ação coletiva pela preservação da vida. E aí estão embutidos interesses políticos e financeiros. Em maio de 2020, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), mais de 40 milhões de posts relacionados ao coronavírus foram marcados no Facebook como falsos pela própria empresa. E pesquisas indicam que o Facebook não marca nem a metade das fake news que circulam na plataforma.
Nos últimos meses, temos sido expostos, diariamente, a notícias falsas sobre vacinas. E, por mais absurdas que possam ser, muitos de nós acreditamos nelas. Levantamento feito pela empresa Inteligência em Pesquisa e Consultoria (Ipec), em fevereiro deste ano, mostrou o alcance destas notícias fabricadas: metade dos milhares de entrevistados, ao serem questionados sobre textos falsos, concordaram com pelo menos uma fake news sobre vacinas contra a covid-19. Boa parte deles disse que concordava com mentiras como a existência de tratamentos alternativos para a covid-19 e a possibilidade de a vacina transmitir o coronavírus. Numa condição de insegurança sanitária e incerteza sobre o futuro, nunca foi tão fácil ser enganado e de forma tão desonesta.
Adriana Teixeira É jornalista, pesquisadora, doutoranda em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP. Atuou como repórter e editora, por 20 anos, nos jornais Diário Popular, Diário de S.Paulo e Brasil Econômico. Também realiza palestras sobre seu principal objeto de pesquisa: desinformação científica.
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Jornalista, pesquisadora, doutoranda em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP. Atuou como repórter e editora, por 20 anos, nos jornais Diário Popular, Diário de S.Paulo e Brasil Econômico. Pesquisadora e palestrante do tema desinformação científica.